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(Repostagem)

HOMENAGEM A

GABRIEL GARCIA MÁRQUEZ – 8O ANOS



Gabo para iniciantes
Por Adalberto dos Santos

O que é verossímil e o que não numa ficção, ou quais os limites que separam o real do fantástico em literatura? Questões que desde há muito fazem os estudiosos e que, muitas vezes, acompanham o leitor no ato mesmo da leitura quando diante de um enigmático emaranhado de fatos e relatos para os quais nem sempre obtém respostas. É o que se diz da leitura de um Kafka, de um Gabriel Garcia Márquez. Essa literatura causa certo estranhamento aos que nela se iniciam. Claro, literatura recheada de artifícios artísticos que, dominantes no texto, espantam o leitor. Por outro lado, em tal ficção, são os modos autênticos de expressão da realidade que proporcionam a grandeza poética através da qual ocorre o prazer estético esperado no ato de ler.
Em Garcia Márquez, confessadamente influenciado pelo autor de O processo, o estranhamento é alentado por uma linguagem acessível, de teor bastante coloquial, embora os elementos ficcionais presentes nas obras envolvam de tal forma o leitor que este se veja assaltado em sua sensibilidade, a ponto de questionar: isto é aceitável, é razoável, é verossímil? Tomemos Cem anos de solidão.
Romance mais popular de Garcia Márquez, traduzido para quase 40 idiomas, com mais de 30 milhões de exemplares vendidos no mundo inteiro, Cem anos de solidão (1967) narra a trajetória dos fundadores de Macondo ao longo de um século de história. Aldeia imaginada por Márquez, localizada num ponto remoto e distante de toda civilização, em Macondo conhece-se os Buendia (Úrsula Iguarán, José Arcadio, Amaranta, José Arcadio (filho), o coronel Aureliano Buendía, protagonista, Rebeca Montiel, Melquíades - os dois últimos, espécie de Buendía por adoção) e mais não sei quantos personagens que entram e saem de Macondo, morrem, desaparecem, enlouquecem e testemunham os mais extraordinários acontecimentos. Situações que extrapolam o convencional, aquilo que razoavelmente aceitamos como lógico e temos como próximo de uma realidade plausível.
Há vários exemplos na narrativa, como a epidemia de insônia que afeta toda a Macondo, deixando a população sem dormir, sem lembrar os nomes das pessoas, dos objetos e da própria identidade, o dilúvio que dura mais de quatro anos, ininterruptamente, mortos que conversam com vivos, moças que voam, personagens que sobrevivem a seqüências de pestes e doenças de todos os tipos. Diante de tais episódios, inevitavelmente a pergunta: como é possível?
Diríamos ao leitor surpreso, em linguagem atual, que ele está diante do que se pode chamar de “efeitos especiais da ficção”. Aí a ficção dá um giro maior que o mundo real do leitor e por isso o espanta. Acuado, ele não foge: é decifrar a charada ou perder a aposta. Em linguagem crítica, explica-se que se trata de uma realidade estritamente literária (apesar de poder ter sua origem em dados reais, vividos pelo escritor e recriados a seu modo), mas nem por isso menos real ou lógica que não possamos entendê-la.
O estranho dos acontecimentos responde pelo poético nome de “realismo mágico”, ou “realismo fantástico”, prática ficcional de que faz uso Garcia Márquez em seu trabalho artístico e que consiste, segundo João de Melo, numa atividade simples e simultaneamente deslumbrada, recorrendo aos grandes temas sociais, sem dúvida, mas envolvendo as realidades descritas numa auréola de sonhos, crenças e rituais lendários. Assim, no mundo imaginário criado pelo artista, tudo é possível, e tudo se explica, os acontecimentos mais improváveis ganham uma lógica própria, porque possíveis e explicados no próprio contexto da narração. E há uma definição de Gabo para o romance que se encaixa perfeitamente na descrição de “realismo fantástico”: "Acho que um romance é uma representação cifrada da realidade, uma espécie de adivinhação do mundo. A realidade que se maneja num romance é diferente da realidade da vida, embora se apóie nela. Como acontece com os sonhos" (palavras de Márquez em Cheiro de goiaba, 1982).
Por “realismo mágico” entende-se ainda grande parte da arte feita na América Latina na década de 50 do século XX por autores que juntavam a tais procedimentos estéticos o diálogo com a realidade latino-americana, daí ora ser chamado de “realismo mágico latino-americano”, com estatuto de gênero literário surgido quando do lançamento de Cem anos de solidão.
Embora a noção de um procedimento que explica a existência de alguns acontecimentos na ficção de Garcia Márquez, temos que as experiências de vida do escritor de alguma forma também lhe tocam a obra. Não por pura confissão, mas, como disse Gabo (apelido do escritor), porque a história da vida de cada um não é apenas o que se viveu, mas o que se lembrou e o que se contou sobre ela. As palavras de um escritor num romance podem ser, pois, parte de sua experiência real, como muitas vezes sugeriu o Nobel de 1982.
Macondo, sabemos, Macondo não existe, mas vive nas lembranças do escritor como um reflexo do povoado da costa atlântica da Colômbia chamado Aracataca, onde Márquez nasceu aos 06 de março de 1927. Jose Arcadio Buendía, pai do protagonista, Aureliano, é um pouco o avô de Gabo, o coronel Márquez, e, de alguma forma, o próprio Aureliano, herdeiro da solidão dos Buendía e personagem recorrente nos romances do colombiano. O coronel Aureliano Buendía torna-se tão importante na obra de Gabo que o encontramos em mais dois de seus livros, El coronel no tiene quien le escriba (1961) e Crónica de una muerte anunciada (1981). Recentemente li que o personagem também aparece num conto do escritor intitulado “Los funerales de la Mamá Grande".
Bem, Arcadios e Aurelianos à parte, é sempre um prazer ler a literatura de Gabo: é como adivinhar o mundo, magicamente.



Entao é isso: garcia Marquez nao complica a literatura. Isso é a mais apurada imaginação em campo. Muito bem, professor. Parabens ao escritor pelos 80 anos, bem vividos e escritos, para nossa felicidade. Abraços. Carlota.

Não posso me aprofundar no assunto, pois, pouco o conheço. Mas, lembrando o ambiente mágico de Macondo, em Cem Anos de Solidão, que eleva a realidade a um sonho, sintetizando os mais diversos elementos: a história, a natureza, os problemas sociais e políticos, a vida quotidiana, a morte, o amor, as forças sobrenaturais, o humor, o lirismo... De tudo isso surge um deslumbrante romance, exemplo único daquilo que a partir de então passa a ser designado por realismo fantástico. E mais umas vez fazendo uso da minha lembrança, recordo minha professora de literatura, Ilma. Socorro Vieira, que sempre dizia: Ler Gabriel Garcia Márquez, o tempo é distorcido, para que o presente se repita ou se pareça com o passado.
Você, como sempre arrasou!

Um abraço!
Craibeira.

Cem anos de solidão... pouca ou muita solidão??? ou apenas a soma de tempo de uma solidão recorrente???
Não sei. E não importa. Cem anos de solidão é o melhor livro que já li.
Parabéns pela homenagem.

Ewerton Anízio de Moura Chaves

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