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Doutor da Praça - Por Crys


Hoje fui pra minha caminhada costumeira na Praça da República. Já passava das seis e meia da manhã, estava uma manhã tranqüila... Pelo menos é o que parecia a princípio.

O tempo estava nublado, o céu com algumas nuvens escuras (nessa época do ano as chuvas são mais constantes em Belém), apesar das nuvens se mostrarem no céu, eu tinha esperança que o sol brilhasse. Durante a caminhada, olhava atenta a tudo que se passava em volta da praça com suas mangueiras majestosas formando um túnel verde.

Ali na praça sempre há concentração de artesões, fazendo bijuterias. Em uma das voltas da caminhada vi ao lado de um artesão uma mulher sentada que de repente caiu para trás e bateu a cabeça na calçada. Nos primeiros minutos parei e fiquei olhando enquanto os outros artesões corriam em socorro à mulher.

Vi também que se afastaram tão rapidamente de como se aproximaram. Não entendi nada. Mas fiquei curiosa e me aproximei pra ver o motivo pelo qual se afastaram de lá. Afinal, parecia que a moça precisava de ajuda. Foi então que percebi o seu companheiro tentando abrir os olhos da moça desfalecida com força, percebi também, que a mulher estava grávida de uns seis meses mais ou menos. O infeliz do seu parceiro empurrava um garotinho de uns quatro aninhos e pedia insistentemente que ele puxasse o pé da mulher.

Pelo sotaque, parecia ser nordestino. Embravecido ele puxava os olhos da mulher com tanta força que parecia que ia rasgar. Lá fui eu, completamente incomodada com a situação, me aproximei pra prestar a minha solidariedade, falei:- Ei moço, a moça está desmaiada, não adianta forçar o olho dela pra abrir, porque não vai acordar desse jeito, é melhor telefonar para o 192, eles vem buscá-la.O homem arregalou dois "olhões" de ódio em cima de mim e falou:- Vai morrer pra lá sô, eu não quero opinião de ninguém, eu sei que tô fazendo.Falava com tanta raiva que eu me assustei e me afastei de imediato.Alguns metros do casal, uma outra moça sentada, fazia uns brincos e ao notar minha preocupação, sem me fitar e de cabeça baixa, falou:- Não adianta não moça, esse parceiro da Diana é um grosso, mas nós já telefonamos para ambulância.Fiquei ali, sem me afastar do local, aflita esperando o socorro chegar pra ver os acontecimentos finais.

Minutos depois, chega a ambulância. Dois enfermeiros descem, chegam até a mulher caída e tentam colocá-la na maca. Mas são impedidos pelo parceiro, que grosseiramente, parte para cima dos dois maqueiros. Assustados recuam sem saber o que fazer. Os dois bombeiros que acompanhavam a operação de resgate ao verem aquela cena, aproximam-se para saber o que estava acontecendo. O tal marido valentão parte também pra cima dos dois bombeiros que são obrigados a se defenderem e com uma rasteira imobilizam o "valentão" no chão e o algemam. Ele é carregado para a ambulância junto com a mulher e o filho pequeno. Inconformado o individuo começa a gritar:- Solta eu moço, solta que eu sei tomar conta dela. Não preciso de ninguém. Ela é o meu amor moço... Eu preciso cuidar do meu amor.

Ele é ignorado e levado na marra, presenciado por pedestre que se juntaram no local, alguns com expressões de tristezas e outros que riam do acontecimento.

O sol já brilhava timidamente quando atravessei a rua em direção a minha casa. Escutava o barulho da sirene se afastando, eu com aquela cena toda na mente me perguntava a todo instante?- Meu Deus, que forma de amor é essa?

Crys - do Blog Jardim de Letras - http://letrasecrystais.zip.net/
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